“Oi, tudo bem? Tudo”,
“Ai, que gostoso”,
“Cadê a vovó? Cadê meu velho? Cadê Bubu? Cadê o Boomer? Cadê a mamãe?”,
“Bom dia”,
“Viva o Getulinho!”
E mesmo quando não agüentávamos mais suas cantorias e assobios, pedíamos: “Getúlio, fica quieto!”, mais do que prontamente, ele respondia: “Não”.
Ele ficou conosco pouco menos de dois anos. Tempo muito curto pra quem já se preparava em passar os próximos sessenta anos agüentando toda aquela falação.
Nunca achei que eu fosse desenvolver um carinho tão grande por esse animal verdinho, mas vai ver, herdei a paixão da minha mãe, que a vida inteira tentou ter um, e a história acabou dessa forma.
Há três semanas o Getúlio foi diagnosticado com candidíase estomacal. Aparentemente, é algo comum entre pássaros. Minha mãe fez de tudo, tratou-o da melhor forma possível, comprou os remédios mais caros, não poupou gastos nem atenção para que ele continuasse nos dando alegria. Mas isso não aconteceu.
Hoje de manhã, nosso bebezinho faleceu nas mãos da minha mãe, enquanto ela tentava alimentá-lo. Ele estava sofrendo, eu sei. Há dias que não comia nada, apenas tomava antibióticos e vitamina, o que pelo visto, não foi suficiente.
Eu não sei o que Deus pensa da vida, e até duvido que ele pense, mas sei que ele é um velho desgraçado que vê prazer no sofrimento contínuo de uma família já desmoronada. Desde que me conheço por gente, as pessoas ligadas à mim pelo laço sanguíneo só se fodem. Não é justo. Minha mãe teve uma vida desgraçada pela infelicidade em todos os aspectos que formam um cidadão e a única alegria dela era a porra do Getúlio. Por quê, então, esse pseudo todo poderoso, que se diz misericordioso não deixou que o Getulinho ficasse aqui, conosco? Por quê mais essa tragédia tinha que assolar a gente? Não pedi por dinheiro, nem fama...nem sequer emprego eu tô pedindo! Só que queria continuar a acordar aos sábados ouvindo todo aquele falatório, vê-lo dançar feito um lunático ao som de qualquer música, estar no sofá, e de repente, sentir os pezinhos dele escalando até se ajeitar no meu joelho e ficar me fitando com aquele olhar de esguelha, semi-cerrado.